quinta-feira, 27 de maio de 2010
Fado em dois
Tenho o coração partido
Em dois pedaços iguais
Se um faz todo o sentido
O outro, por estar partido
Não sei se estará a mais
De um lado, sinto o que sinto
Do outro, não sei dizer
De tão partido que está
Faço o que ele me manda
Não sei que hei-de Eu fazer
Eu sei que Deus dá-me tanto
Mesmo sem eu saber quando
De forma que vou esperando
Da forma que lhe aprouver
Lá pela noitinha
Recordo nas minhas preces
As formas com que te teces
Que só Deus soube fazer
Mas por favor
Não me digam que assim fico
Quero ser eu, senão grito
Quero ser quem eu quiser
sexta-feira, 21 de maio de 2010
Se um dia eu morrer
Se um dia eu morrer
Por sorte, ficar sem nada
Ficará sempre a doer
A memoria de te ter
A sorte de ter, em cada
Cada um dos teus gemidos
Prazer disfarçado em dor
Queixumes que são devidos
A quem tem dever de amor
E a memória traiçoeira
De quem navega o mundo
Pode trazer, noite inteira
Se um dia eu morrer
Um prazer bem mais profundo
A experiência de um homem
Não é o que lhe acontece
É antes, e não parece
O que faz com ela o homem
Vou correr para te ver
Alma que és, nua e singela
Lago calmo, caravela
Como as cores de uma aguarela
Se um dia eu morrer
quarta-feira, 12 de maio de 2010
"Nas minhas conversas com Deus" - João Azevedo
Nas minhas conversas com Deus
Sempre mais perto dos Céus
Não há certo nem pecado
Há somente este fado
Que antecede o adeus
Não cheguei ainda a partir
E já sinto que sou eu
Ao ver a luz tão distante
Penso talvez, num instante
“ Que todos os ais são meus “
Os Anjos juntos em coro
Rejubilam por me ver
E os clarins tocam hinos
Com a força de meninos
Pela nova forma de ser
Olhai-me de baixo, olhai-me
Já nasceu um novo dia
Abri portas à alegria
Morri de uma vida fria
E a vida chegou ao Céu
terça-feira, 4 de maio de 2010
De: Cesário Verde
Eu que sou feio, sólido, leal
A ti que és bela, frágil, assustada
Quero estimar-te, sempre recatada
Numa existência honesta, de cristal
Sentado à mesa de um café devasso
Ao avistar-te há pouco, fraca e loura
Nesta Babel tão velha e corruptora
Tive tentações de oferecer-te o braço
E quando socorreste um miserável
Eu, que bebia cálices de absinto
Mandei ir a garrafa, porque sinto
Que me tornas prestante, bom, saudável
Ela aí vem, disse eu para os demais
E pus-me a olhar, vexado e suspirando
O teu corpo que pulsa, alegre e brando
Na frescura dos linhos matinais
Vi-te pela porta envidraçada
E invejava, talvez não o suspeites
Esse vestido simples, sem enfeites
Nessa cintura tenra, imaculado
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